Nos múltiplos
referendos anexos às últimas eleições americanas, três estados votaram a
favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Na França, a medida foi
aprovada há pouco e Nova Zelândia, Inglaterra e Escócia preparam-se
para a adoptar. Existe claramente uma onda triunfal, sobretudo entre
países ricos, que parece inverter o panorama neste tema. Assim esta
geração muda a milenar definição de matrimónio. O mais espantoso nisto é
ninguém parecer dar-se conta do ridículo da situação.
Primeiro,
esta suposta grande conquista dos direitos humanos não envolve nada de
realmente importante. Não estão em causa pessoas mortas, feridas, presas
ou sequer incomodadas na sua vida pessoal. É literalmente uma questão
de secretaria. Quando a nossa geração pretende emular as lutas dos
tempos heróicos contra escravatura, pena de morte ou pelos direitos dos
trabalhadores e minorias, o melhor que consegue é isto. A seguir deve ir
tratar de maçanetas para canhotos ou semáforos para daltónicos. Não é
por falta de assuntos graves, pois, entre muitas outras injustiças
clamorosas que passam impunes, temos milhões de embriões chacinados pelo
aborto todos os anos. Mas esta geração toma isso como conquista
democrática.
O segundo aspecto é que o tema escolhido cai logo na
área em que as nossas instituições têm feito ultimamente os maiores
disparates. Durante milénios, o Estado não casava ninguém, deixando isso
ao costume social ou às entidades religiosas. Em Portugal, o casamento
civil só surgiu em 1832, obrigatório a partir de 1911. Na Inglaterra foi
apenas em 1837, na Alemanha em 1875; até a França, a mais antiga,
teve-o unicamente em 1792. A situação anterior é razoável por ser
sumamente aberrante o rei pretender regulamentar o amor. Só um tempo
como o nosso, com uma doentia ânsia legislativa, aspira a tal coisa.
O
pior é que nestas poucas décadas o Estado conseguiu fazer uma
salganhada de uma responsabilidade tão importante. Neste momento, em
Portugal, custa mais despedir a criada do que o marido, pois o contrato
de casamento é mais frágil do que o de trabalho ou sociedade. Como além
disso a lei fez questão de estender aos solteiros os direitos dos
casados, através da promoção das uniões de facto, a instituição do
casamento civil é hoje quase inepta. Afinal os antigos tinham razão. De
fora até pode parecer que o Estado ocupou-se da instituição apenas para a
abandalhar.
Não admira que as pessoas ultimamente se tenham
deixado disso. Os valores de 2010, último ano disponível, são de 3.8
casamentos por mil habitantes, descendo de mais de sete em 1992 e quase
dez em 1973. Parece que hoje em dia os homossexuais são os únicos que
querem casar-se. Aliás nem esses, pois, após séculos de repressão, o
surto inicial de casamentos civis entre pessoas do mesmo sexo gerado
pela Lei 9/2010 de 31 de Maio foi de... 266 em 2010. Uma marcante
conquista da civilização, como se vê!
O pior é que este campo,
onde tantos activistas se esforçam generosamente por conseguir avanços, é
precisamente aquele em que se situam as grandes calamidades desta
geração. Só que não é desse lado, mas precisamente do oposto. Os dramas
da solidão, traição, traumas infantis, promiscuidade são consequência
directa da mesma ideologia antifamília que triunfa nestes supostos
avanços. A taxa de divórcio já é 2.6 por mil habitantes. Ou seja, por
cada 19 uniões novas desfazem-se 13. A nossa taxa de fertilidade, 1.3
filhos por mulher, das mais baixas do mundo, está ao nível de catástrofe
demográfica. Os problemas psicológicos, educacionais, culturais,
sociais, económicos e financeiros que isto cria seriam inimagináveis se
não os observássemos quotidianamente. É um processo de demolição da
sociedade e civilização portuguesa e ocidental sem precedentes.
Será
difícil as gerações futuras entenderam como foi possível ignorar
problemas tão vastos, graves e influentes, indo perder tempo com
questões laterais e menores. Mas seremos pouco castigados, pois a
devastação desta geração tornará as seguintes pequenas, esparsas e
traumatizadas.