sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Apelo à Sarrafusca

Quando ainda jovens lemos no Evangelho a parábola do semeador, embora a compreendamos, de algum modo, temos dela um entendimento incompleto, por abstracto. De facto, não nos passa pela cabeça que aqueles nossos amigos com quem orámos, com quem partilhámos aventuras apostólicas, organizámos retiros, missões populares, experiências de eremitério, passados alguns anos deixem de acreditar em Deus, ou estejam vivendo arredados da lei do Senhor, comportando-se de modo contrário ao Evangelho ou mesmo combatendo-o. Mas infelizmente, como nos advertiu Jesus Cristo, isso acontece.

O facto de isso acontecer provoca em nós, por um lado, uma grande dor, uma enorme tristeza e, por outro, um sentimento de advertência: também nós, que somos feitos da mesma “massa” que os outros, podemos vir a cair e a trair. Por isso, devemos não só agradecer o permanecermos n’ Ele mas temos também de implorar continuamente a Graça da fidelidade, pedindo que o Senhor não permita que d’ Ele nos separemos, antes aumente em nós o Seu amor e o amor a todos os que Ele criou e por quem Se entregou à morte para os salvar. Consequentemente, é impossível ficarmos indiferentes à circunstância e ao destino desses nossos amigos.

Desde há muito anos que nas minhas orações quotidianas peço por todos aqueles que conheci na minha vida de Padre (e também por todos os que virei a conhecer). Mas confesso que agora, ao celebrar o vigésimo quinto aniversário da minha Ordenação Sacerdotal, tomei uma consciência mais viva de como eram numerosos os que andavam dispersos e perdidos. Meditando então nos vários movimentos e grupos com quem estive em contacto e trabalhei recebi a inspiração de apelar a uma sarrafusca, isto é, a uma insurreição, daqueles, que não obstante as suas fragilidades e quedas se levantam, permanecendo assim na Comunhão com Cristo, para que unidos na oração, no jejum ou/e em outros sacríficos combatam o “bom combate” da Fé em favor dos seus amigos. De facto, o cristão, como dizia o então teólogo J. Ratzinger, não o é para que ele se salve e os outros se condenem mas para que através da sua Fé os outros também se possam salvar. Isto é, a nossa Fé deve ser vivida com tal generosidade e amor que toque, em Jesus Cristo, a liberdade dos outros de modo a transformá-la em liberdade de tender para Deus, em liberdade de se abrir à Sua Graça, ao Seu amor, e por ele se deixar transfigurar.

É verdade que isto que se refere diz respeito a todos, em geral. Mas podemos dizer que temos uma obrigação particular em relação aos nossos familiares e amigos, aos que nos estão ou estiveram próximos. Por isso o meu apelo à sublevação contra o Maligno e o pecado é um convite muito concreto a que cada grupo ou movimento, com discrição e humildade, se disponha a rezar e sacrificar por aqueles que os fundaram ou por ali passaram e que agora se encontram longe, em terra estrangeira, esbanjando os seus talentos, vivendo com os porcos, tentando alimentar-se de bolotas. Isto, é bom de ver, não deverá ser deixado somente à espontaneidade de cada um mas importa que seja organizado e em comunidades.

Espero, dentro em pouco, ter notícias vossas sobre como se organizaram e como estão correndo as coisas. Podem contar comigo e com muitos outros Sacerdotes que vos auxiliem neste trabalho esforçado de conversão dos pecadores, como Nossa Senhora pediu tanto em Fátima.


Nuno Serras Pereira

30. 09. 2011