quinta-feira, 22 de outubro de 2009

O Toque do Mistério


1. Na tarde plúmbea e chuvosa de ontem as mulheres encharcadas, lá, mantinham a sua presença compacta, esperançosa e perseverante, num grito mudo, porque do coração, pedindo ao Céu, aparentemente carrancudo, a aspersão da Palavra fecunda, única capaz de rebentar penedos, transformando desertos pedregosos em veigas verdejantes.

Passou numa pressa de fuga sem deixar, no entanto, de lançar um olhar de esguelha àquelas mãos que faziam correr pausadamente entre os dedos umas rosas lançadas à mais alta entre todos os filhos do Altíssimo. Entrou sem relancear o olhar para trás. A decisão já tinha sido tomada irrevogavelmente. Diante da recepção não ouviu o som da porta a fechar-se, o pensamento estava apegado, ou melhor, tinha sido absorvido pela realidade para a qual o sinal apontava. Esta envolvia-a num amplexo de ternura e misericórdia. Estremeceu de comoção, arregalou os olhos e abriu a boca, à maneira de quem desperta dum sonho, dum pesadelo, duma hipnose maliciosa. De repente virou as costas à recepcionista que a fixava interrogativamente, saiu porta fora, aspirou com grandes sorvos ao ar húmido da tarde, dirigiu-se às mulheres abraçou-se com elas e lacrimejando disse: Eu sei, eu sei por que estão aqui! Eu vi os terços (os rosários)! Eu vi! Sei por que estão aqui! Vou deixar que o meu filho viva! Sim!, vou acolhê-lo! Vou! Vou! Ele viverá! Muito obrigado! Ele viverá!!

Foi a segunda criança nascitura que ontem foi redimida de uma morte certa pelas “Mãos Erguidas” das “Peregrinas de Fátima”.

2. Mais tarde, a proprietária do abortadouro dos Arcos postou-se provocatoriamente diante do grupo que rezava outro terço e desatou numa risada sarcástica, despudorada, desembestada, demoníaca. Como aquilo não parasse, logo lhe disse a fundadora: está-se a rir, mas olhe que também estamos aqui a rezar por si. Você não sabe mas Deus ama-a muito. Você agora está nas trevas mas um dia também encontrará a Luz. Ria-se à vontade que não a deixaremos de amar por isso.

Desvaneceu-se aquele gargalhar escarninho, tornando-se aquele semblante meditativo, e logo dali fugiu.

3. Tem vindo progressivamente a aumentar o número de voluntários que à porta daquele abortadouro se dispõe a dar testemunho da sua Fé, salvando filhos e mãe grávidas de uma tragédia. Quer compartilhar daquelas alegrias participando dos seus sacrifícios? Voluntarie-se, apareça, não se arrependerá. “A messe é grande mas os trabalhadores (ainda) são poucos”.

Nuno Serras Pereira
22. 10. 2009