In Expresso
Camilo está a ser a minha obsessão de verão. Ou melhor, a retirada de Camilo dos programas das escolas está a ser a minha obsessão estival. Por que razão os pedagogos retiraram Camilo Castelo Branco dos programas de português? Será por isto ? Ou será aquilo ? É isso tudo, sim senhora, mas não podemos esquecer o mais simples: Camilo é difícil. Hoje em dia, é impossível ler Camilo sem o dicionário. E, diga-se, é mais do que divertido ir ao dicionário ver o significado de palavras como "tunda", "esmadrigada", "cainçada", "parlenda", "regougar", "alcouve" (que belo sinónimo de bordel). Ora, na minha enorme ignorância, eu pensava que este exercício, que põe um adulto vacinado de cabeça à roda, seria fundamental para um adolescente do 10.º ano ou assim. Mas, como se sabe, eu estou sempre errado. Neste caso, quem está certa é a moda da escola inclusiva, isto é, a escola que ilegalizou aquilo que é difícil.
Os meninos já não têm de saber escrever. Saber escrever é uma coisa do antigamente. Agora, basta fazer um teste de cruzinhas e, acima de tudo, já não é preciso ler autores difíceis. Donde a introdução de coisas como os guiões de "Morangos com Açúcar", que vieram substituir os clássicos da literatura nas aulas de português. Naturalmente. Como é óbvio. Além das questões narrativas e de conteúdo, os meninos, coitadinhos, não seriam capazes de passar vários minutos (deixem lá as horas) a ler uma coisa que implica a ida ao dicionário. Os meninos que usam a máquina calculadora são os mesmos que não podem usar o dicionário, ora essa. Aprender vocabulário é uma cena do tempo da outra senhora. A língua materna, composta por "côngrua", "nastro" ou "casquinar", é um obstáculo à escola inclusiva e à tal comprehensive approach do eduquês. Ante Camilo, os meninos, que chegam ao fim do secundário a escrever "sequesso" e "ceclo", ainda apanhavam um torcicolo com a constante ida ao dicionário. Coitadinhos.