quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Emergência Nacional! - por Nuno Serras Pereira

Passo a transcrever o discurso de um camarada (gravado com o telemóvel) que escutei na noite de Natal, depois da Missa do Galo, ao deparar, imprevistamente, com uma aglomerado compacto de gente, no regresso ao convento: 

A catástrofe está aí e ninguém deu por nada, a não ser um resto bárbaro de verdugos de mulheres! Pois então não há quem se levante e se amotine perante esta calamidade do encarceramento de uma mulher só porque matou dois rebentos, um de dois anos e meio, e outro de um. Pelos vistos querem empurrar as mulheres para o infanticídio clandestino! Não há nenhuma mulher que infanticidie de ânimo leve! As mulheres são responsáveis! Querem obrigar as mulheres a serem mães!


Então está tudo esquecido das declarações, proclamações, entrevistas, debates, manifestações, publicações, diariamente, durante anos infindos, que fizemos contra a prisão das mulheres por homicidiarem seus filhos nascituros, quando nenhuma estava detida!? E agora que lançaram esta numa enxovia, ainda antes de ser julgada, estamos entorpecidos, calados, indiferentes, entretidos! Não sabemos nós camaradas que a mulher parricida de seus rebentos é uma vítima!? Ignoramos porventura que aqueles pedaços de gente, quase humanos, não são pessoas!? Nem barba! Nem dentição de jeito! Nem seios! Nem capacidade de se reproduzirem! Nem uso da razão! Nem cérebro totalmente formado! Aquilo são tumores vadios! montes de células esperneantes! Berreiros de fraldas! Predadores de nosso sossego! Devoradores do nosso sono! Egoísmos insaciáveis! Esparvoados de chupeta! Só quem quer traumatizar as mulheres, argui-las, acusá-las, prendê-las, é que monstruosamente inventa essa nomeação de pessoa!


Camaradas! Esta mulher encalabouçada, perseguida brutalmente pelos esbirros de uma comunicação social ignara e primitiva, censurada pelos infames cristãos, vituperada pelos crudelíssimos pró-vida, é uma vidente, uma pioneira! Ela antecipou genialmente aquilo que não nos atrevemos a pensar ou, pelo menos, a declarar: o abortamento depois do parto, o aborto infantil. 


Faz todo o sentido, camaradas! Agora já podemos dizê-lo, camaradas, a liberalização do abortamento até às 10 semanas constitui um limite desumano, aliás, qualquer IVG até ao parto é impiedosa para a mulher. Nisso teremos de reconhecer alguma, embora diminuta, razão aos trogloditas implacáveis inimigos das mulheres. Há sempre nefastos efeitos secundários dos fármacos e consequências nocivas das cirurgias. Além disso, há grandes custos suportados pelo serviço nacional de saúde e pela segurança social. Acresce que se podia afectar esse pessoal de saúde a outras áreas diminuindo assim algumas listas de espera. 


Mobilizemo-nos camaradas! Reivindiquemos o direito das mulheres ao aborto infantil! É fácil, é barato, ou melhor, de graça, pode-se fazer aos milhões. Não constitui perigo para as mulheres. Elas poderiam, até à idade da razão (7 ou 8 anos) decidir se queriam ou não ser mães. É preciso verificar se os filhos vêm em condições, se a conjuntura económica e social permite ou não tê-los, se são enfermiços ou escorreitos, se têm ou não aproveitamento escolar, se são dotados para o desporto ou não, se estão ou não concordes com as preferências das mulheres, etc.


Urge, de imediato, um referendo sobre a liberalização do infanticídio. O povo português tem continuamente dado provas do seu bom senso, da sua sensatez, do seu humanismo.


Pela circunstância que vivemos, em virtude do que escrevemos acima, temos a vitória garantida, libertaremos as mulheres desta escravidão moralista que as oprime, ergueremos uma estátua à grande pioneira, fá-la-emos candidata a primeiro-ministro, nas próximas eleições, e ninguém nos vencerá. 


Não, camaradas, pelos corpos! (a minha mãe dizia pelas almas, mas não passava de uma supersticiosa retrógrada, alienada), não! A actual maioria parlamentar poderá rouquejar umas palavras de crítica mas no fundo não se oporá. Aliás, camaradas acabaram sempre por se render aos nossos propósitos consolidando aquilo que contra eles conquistámos, como agora se tem verificado em relação à liberalização do aborto. A Igreja também amandará umas bocas mas, como tem medo de aparecer como derrotada, crucificada na opinião pública, daí não virá resistência significativa. Camaradas, dentro em pouco teremos os nossos advogadores do infanticídio pregando na Rádio Renascença e ensinando na UCP. Dos movimentos pró-vida também nada há a recear, dar-lhes-emos a derrogação da liberalização do aborto até às 10 semanas e é vê-los, com a Igreja, muito felizes por após estes anos de luta conseguirem o que vão considerar uma vitória triunfante. Não é verdade, que desde que ganhámos o referendo de 2007, da liberalização do aborto, eles repetem até à saciedade que ganham o referendo todos os dias?


Alerta camaradas! Recorramos às tácticas costumeiras! Lancemos de nós esta anestesia que nos impediu de reagir a este ataque ignóbil às mulheres. Os amanhãs cantarão para elas!



 26. 12. 2012