Rui Corrêa d' Oliveira
Olhar sobre Judas
Na madrugada daquela sexta-feira, Judas conduziu até ao Gethsemani
os que procuravam Jesus para O prender.
Ao vê-lo chegar, Jesus olhou Judas e disse-lhe:
«Amigo, a que vieste?» (Mat 26, 50)
Olhaste Judas e descobriste nele o traidor.
Olhaste Judas e puseste a nu o seu pecado.
Olhaste Judas e viste nele o Amigo a quem amavas
e continuaste a amar… até à Cruz!
Olha-me Senhor com este teu olhar
que descobre em mim a verdade de que é feita a minha vida.
Olha-me Senhor com este olhar
e não Te detenhas no meu pecado.
Quero ouvir da tua boca a mesma certeza
de que a Tua amizade por mim permanece!
Olhar sobre Herodes
«Ao ver Jesus, Herodes ficou muito satisfeito. Havia bastante tempo que O queria ver, pelo que ouvia dizer d’Ele… Fez-Lhe muitas perguntas, mas Ele nada respondeu».
Finalmente Jesus e Herodes, frente a frente, olhos nos olhos….
Não houve diálogo.
De Jesus não obteve uma só palavra,
apenas um insuportável olhar em silêncio.
O poder e a força esmagados sob o olhar de um homem só e indefeso.
Toda a arrogância e toda a retórica humilhante de Herodes
embateram impotentes no olhar penetrante de Jesus.
O que mais me comove é que nesse Teu olhar silencioso,
não havia ódio nem rancor:
Tu amavas, Senhor, com esse amor que vence a maior ingratidão.
Olhar sobre Pedro
«Voltando-se, o Senhor fixou os olhos em Pedro; e Pedro recordou-se da palavra do Senhor, quando lhe disse: «Hoje, antes de o galo cantar, irás negar-me três vezes.» E, vindo para fora, chorou amargamente.»
Na hora da verdade,
o mesmo Pedro que Te prometera fidelidade até à morte,
nega-Te por três vezes.
O medo foi mais forte que a amizade.
O medo foi mais forte que a verdade.
Quanto Te terá doído a negação de Pedro…
Num último gesto de compaixão, fixaste o Teu olhar em Pedro
e tanto bastou para provocar o seu arrependimento.
Olhaste Pedro,
apesar de Ele Te renegar.
Olhaste Pedro,
apesar da dor do desamor.
Olha-me Senhor com este Teu olhar que não condena, mas redime;
que não rejeita,
mas permite que eu não fique prisioneiro do meu limite,
reconhecendo, arrependido, o meu pecado
e acolhendo, humilde, o Teu perdão.
Olhar sobre os que O crucificavam
«Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem»
Os soldados executavam friamente a tarefa tantas vezes repetida
de crucificar os condenados.
Porém, os verdadeiros responsáveis por aquele crime,
assistiam e troçavam.
Qualquer critério de justiça revoltar-se-ia diante de tamanha injustiça,
punindo os culpados do perjúrio e os obreiros da infâmia.
Não foi para tornar a justiça mais justa
que aceitaste a morte na Cruz, Senhor!
Mas para introduzir um critério novo, infinitamente mais potente:
o perdão e a misericórdia!
Olhar sobre Maria
Junto à Cruz estava Maria sua Mãe e o Apóstolo João.
No extremo limite das suas forças, olhou para ela e disse-lhe:
«Mulher, eis o teu filho».
Se as forças do Seu corpo se extinguiam,
a potência do seu Coração permanecia intacta.
Aquela a quem Ele estava unido desde sempre, de modo único e singular,
não poderia ficar entregue à solidão.
Em João encontraria, mais do que o amparo e a companhia,
o amor de um filho adoptivo.
Nesta sua nova maternidade,
Maria acolheu todas as gerações dos que levam no seu coração
a memória da Cruz Redentora.
Olhar sobre João
Do cimo da Cruz, Jesus olhou para João, «o discípulo que Ele amava»,
e disse-lhe: «Eis a tua mãe!» (Jo 19, 27)
Antes de derrotar a morte,
Jesus destrói a orfandade a que João estaria destinado.
Despojado de tudo o que era seu,
Jesus dá o último dos seus bens: a sua própria Mãe!
O único bem que ninguém lhe podia tirar.
«E, desde aquela hora, o discípulo acolheu-a como sua.»
E desde aquela hora também eu recebi Maria como Mãe.
Jesus olhou por mim, como um Pai olha pelos seus filhos,
deixando-me o melhor da sua herança:
a ternura maternal de Maria, sua Mãe.