1. A Pagela - A pagela de Nossa Senhora do Ó, praticamente esgotada desde 1998 (quatrocentos mil exemplares), aparece de novo, para ser distribuída gratuitamente (um milhão de exemplares), com algumas modificações quer na imagem quer no texto. Em vez de longa e estreita é agora um pouco menor que um Bilhete de Identidade, porque dobrada, facilitando assim a colocação na carteira. A primeira face apresenta a imagem, já conhecida, da Senhora grávida do menino Jesus, em pedra de ançã policromada. Originária da Igreja da Misericórdia de Lamego, encontra-se agora no museu da mesma cidade. Abrindo a pagela encontra-se a oração, não toda continuada, mas repartindo-se pelos dois espaços interiores, de tal modo que tanto a primeira como a segunda parte da mesma coincidem totalmente cada uma com a sua página. Fechando a pagela deparamo-nos com uma reprodução de um belíssimo quadro de Rafael representando a Virgem Maria com o Menino Jesus ao colo. Deste modo, Jesus é-nos apresentado, ao princípio, no ventre de Sua Mãe, como concebido ainda não nascido e no final, nos braços da Virgem Mãe, como concebido já nascido. Por outro lado, Nossa Senhora do Ó recorda a todas as mães que também Ela experimentou a gravidez e que por isso as entende muito bem, e as acompanha com solicitude maternal, intercedendo por elas e amparando-as nas suas dificuldades. O feliz sucesso do nascimento do Menino mostra a todos que, não obstante tantas dificuldades e adversidades, Deus não abandona quem d’Ele se não aparta, a Ele se entrega, n’Ele confia.
Mais adiante daremos a razão ou razões da ligeira alteração do texto da oração.
2. O Papa e a oração pela vida – Embora composta no início dos anos oitenta, do século passado, a oração da pagela foi sendo aperfeiçoada, ganhando a sua forma “definitiva” depois da publicação da encíclica Evangelium Vitae do Papa João Paulo II. De facto, depois da leitura atenta desse escrito Papal, em especial do nº 100, o autor sentiu-se não só confirmado, mas encorajado e estimulado a espalhar essa devoção, convicto de que - como aliás sugerira em 1977 ao então Cardeal Patriarca D. António Ribeiro (no salão paroquial da Igreja de S. João de Brito) -, só pondo os católicos do país inteiro a rezar é que se poderia pôr um travão eficaz à cultura da morte, e sustentar e promover uma verdadeira cultura da vida.
Importa citar o Santo Padre: “Certamente é enorme a desproporção existente entre os meios numerosos e potentes, de que estão dotadas as forças propulsoras da «cultura da morte», e os meios de que dispõem os promotores de uma «cultura da vida e do amor». Mas nós sabemos que podemos confiar na ajuda de Deus, para Quem nada é impossível.
“Com esta certeza no coração e movido de pungente solicitude pela sorte de cada homem e mulher, repito ... é urgente uma grande oração pela vida, que atravesse o mundo inteiro. Com iniciativas extraordinárias e na oração habitual, de cada comunidade cristã, de cada grupo ou associação, de cada família e do coração de cada crente eleve-se uma súplica veemente a Deus, Criador e amante da vida. O próprio Jesus nos mostrou com o seu exemplo que a oração e o jejum são as armas principais e mais eficazes contra as forças do mal e ensinou aos seus discípulos que alguns demónios só desse modo se expulsam. Então, encontremos novamente a humildade e a coragem de orar e jejuar, para conseguir que a força que vem do Alto faça ruir os muros de enganos e mentiras que escondem, aos olhos de muitos dos nossos irmãos e irmãs, a natureza perversa de comportamentos e de leis contrárias à vida, e abra os seus corações a propósitos e desígnios inspirados na civilização da vida e do amor.” (João Paulo II, Evangelium Vitae).
3. Vários modos de rezar esta oração – Sempre que possível a oração deve ser rezada na sua totalidade, de seguida. No entanto, há circunstâncias que podem aconselhar que assim não seja. E como por vezes “o óptimo é inimigo do bom” não se deixe de orá-la por ser grande ou complexa, antes se reze ou a) repartida, ou b) alguma das parcelas, ou, pelo menos, c) parte da primeira porção. Explico-me com alguns exemplos: a) nas reuniões de paróquias ou de movimentos, para além das orações habituais, se as há próprias, pode-se, por exemplo, rezar no início do encontro a primeira parte – versículos dos salmos, Pai-nosso, Ave-Maria e Glória – e no final a segunda – Pai Santo, Amor Criador, etc.; b) com pré-adolescentes ou com gente “tarda de coração” pode-se rezar só a primeira parte, ou rezar só a segunda a seguir ao Terço, à Via-Sacra ou à Liturgia das Horas; c) com crianças pode-se rezar somente os versículos dos salmos.
4. Aprovação do Cardeal Ratzinger – Antes de ser estampada e posta a circular foi esta oração entregue em mão ao senhor Cardeal Ratzinger para que desse o seu parecer. O autor tem nos seus arquivos uma carta de monsenhor Josef Clemens, então secretário particular de Ratzinger, dizendo que sua Eminência “deseja dar-lhe conhecimento, de modo totalmente informal, que leu o texto da oração pela vida e que a considera correcta do ponto de vista doutrinal.”. Uma vez que para pôr à disposição do povo de Deus, e por uma questão de comunhão profunda, se requer a aprovação eclesiástica do Bispo da Igreja local ou seu representante foi a mesma pedida ao senhor D. António dos Reis Rodrigues que prontamente a concedeu. Quanto os portugueses devem a este senhor Bispo em matéria de defesa da vida é cousa de poucos conhecida, mas dias virão em que se reconhecerá, admirará e aplaudirá o seu rigoroso e generosíssimo trabalho e empenhamento no que à vida diz respeito.
5. Simplificação e explicitação do texto – O texto, como disse, sofreu duas pequenas modificações. A primeira consistiu em reduzir cinco termos – amemos, respeitemos, protejamos, promovamos e cuidemos – para três – defendamos, amemos e sirvamos. Pode-se dizer que os cinco estão, de facto, incluídos nos três. A versão anterior explicitava mais, daí a profusão, mas sacrificava o ritmo tornando a oração mais difícil de rezar em conjunto. A nova versão optou pela simplicidade e leveza para torná-la mais acessível e apetecível. Não obstante, introduziu um inciso. Em vez de: desde o momento da sua concepção até à morte natural, agora diz: desde o momento da sua concepção, ou fase unicelular, e em todas as fases da sua existência até à morte natural. Este acréscimo meramente explanativo, se é verdade que não ajuda à facilidade de recitação, pareceu muito conveniente por duas razões. A primeira, porque há já quem ande a garantir que na clonagem não há concepção - o que de resto não é verdade; o que não há é fecundação de um óvulo por um espermatozóide -, e estas coisas de tantas vezes repetidas acabam por se tornar aceites e como que “evidências”. Pois para que não haja dúvidas, aí está o unicelular a afirmar a sua existência independentemente do modo como veio ao mundo. Em segundo lugar, com a frase e em todas as fases da sua existência pretende-se incutir melhor a verdade de que a pessoa humana é sempre a mesma seja qual for a sua idade ou estádio de desenvolvimento – zigoto, embrião, feto, recém-nascido, infante criança, adolescente, jovem, adulto, idoso.
Nuno Serras Pereira
13. 10. 2004